Todos os dias João olhava para aquela urna com tristeza. Nas lembranças de uma vida conjunta, vinham as longas conversas, os afagos, as risadas que em seguida se revertiam em lágrimas de saudades. Num ímpeto de revolta decidiu que não guardaria mais aquelas cinzas! Era preciso dar um fim àquelas recordações que só transpareciam em aflição e desgosto. Combinou com o amigo Mario - dono de uma lancha - que levaria a urna para alto mar e lá jogaria as cinzas de sua amada, para que finalmente ela descansasse em paz. E foi o que ele fez.
Na volta dessa cerimônia do adeus, ele pensou nas últimas palavras da sua companheira de tantos anos:
-"Querido, não se prive de viver sua nova vida sem mim. Siga seu caminho com novas conquistas e até se for o destino com um novo amor."
De repente seu coração bateu acelerado e como se tirasse com as mãos, João sentiu uma paz de espírito que há muito desejava. Respirou fundo, olhou para o horizonte e decidiu que daquele dia em diante encontraria um novo modo de vida. Mergulhou as mãos no mar para limpar o pouco de cinzas que ainda sentia nas pontas dos dedos, e com as mãos postas em oração, rezou pela sua amada: "Descanse em paz meu amor".
Tema: Poeira na ponta dos dedos.